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Março 2013

Progresso

Era uma vez um poema urbano que nasceu engarrafado no meio do trânsito. Carregado de ruídos, cheirava à gasolina e sua voz era uma buzina. Nasceu fadado a provocar malefícios, sob o signo do stress, do trânsito e da queima do combustível. Mas apesar do seu triste destino, acreditaram, sem desatino, que ele era moderno, que rodava no caminho para o sucesso, foi chamado de Progresso.

Meu rapaz

A claridade de teus conceitos morais te cega, meu rapaz, não te deixa ver o outro lado do verso. toma esta taça de vinho tinto do minto, do sinto, do instinto... Quem sabe baco,em sua sabedoria, te conduza ao anverso? Só posso dizer que espero Mais uma alma romper a forma alienante. Meu rapaz, o outro lado pode ser fascinante! Imagina... adorar a dúvida, o banho de chuva, as pessoas que se entregam, os acontecimentos mais sinceros... Ah! meu rapaz, toma este vinho e te derrama te deixa fluir e ama, ama, ama...

Passageiros

passageiros... eu, os sonhos, os amores, os temores. Num quarto de hotel, espero o outro dia, novamente, sono, melancolia. Afasto as cortinas da ânsia, sobra tristeza, falta sabedoria. Enxugo as ilusões, abro a janela e expiro as vãs sensações. As luzes das casas estão acesas... pequenas estrelas, no universo dos lares, iluminando jantares, amores, temores, passageiros...

Desejos

Queria te mandar uma poesia, um beijo, um abraço, um bom dia... Queria te dizer que sou tua, inteira, verdadeira, nua... Queria te ver novamente, sorridente, confiante, amante... Desejos não ditos, escritos, malditos, intranquilos... Desejos... Inaudíveis, na gritaria do dia, Ensurdecedores, no silêncio da noite...

Pesadelo

Um grito gutural, grande e agudíssimo, grosseiro e gravíssimo, ressoou...longe... onde, onde, onde? ecoou, ou, ou, ou não. Foram meus pensamentos? o vento? a voz dos sentimentos? a ânsia, o drama, a trama, o enxame, a chama, a cama, a lama, o suspiro, esqueço do umbigo e me torno líquido e aos poucos afundo num mundo profundo, escuro, novamente durmo.

Passos de Bolero

A correria dos dias é a sina de nosso tempo, povoado de maus pensamentos que apressados devoram meus sentimentos, tua paz, nossa mocidade e a lembrança daquela idade... em que a cidade dançava ao som de um bolero... Em toda esquina era um encontro, um sorriso, um lero-lero. Não o barulho angustiante, o grito, o agito, o calor, o enxame, o trânsito nauseante de uma vida que não... Para! Me deixa ficar de bobeira assistindo os passos apressados daqueles que agoniados não percebem a inutilidade da ânsia das gentes, das cidades... Alienados! Tiveram seus futuros roubados, mas não, não se dão conta de que a pompa, o patrimônio, o dinheiro... é tudo fachada do desespero. E eu espero, escuto, venero os dias que passam. E eu espero, danço, venero, meus passos são os do bolero.

A compra da poesia

- Quanto vale o metro quadrado de um minuto de poesia? Pago pela poesia pronta, já embutido no preço o custo da inspiração. - Obrigada, prezado Senhor. Escute essa aqui, a seu dispor... O acabamento é de um requinte contemporâneo, foram utilizadas palavras de altíssimo conceito, todos os versos, rimas, métricas seguem os mais altos padrões de poder, de ter ou de deixar de ser. -E quanto me custará esse espaço de cultura para minha sofisticação? -Foi de graça Senhor. cultura não se compra e poesia é tempo, e o tempo já passou.

Recife & Olinda

Olho pela janela

e vejo Olinda

minha cidade natal,

leve e linda.

De música e poesia

são feitas tuas ladeiras.

Entre histórias e melodias

cresceste de todas as maneiras.

Mas não perdeste o charme

com o avançar da idade

Tua tradição é mais contemporânea

do que os programas de televisão.

Só te conhece quem te vive e te sente

quem anda por tuas ladeiras

embebido de frevo

no calor, na chuva, na certeza

de que não tem maior alegria

do que teu carnaval cheio de fantasia.

Como uma tapioca

e assisto o sol se deitar

em Recife

a cidade alvoroçada

que também é a minha casa.

Se teus rios falassem...

contariam toda a mudança

porque passou tua paisagem

a cada idade uma nova cara,

uma nova imagem.

És minha província preferida

tens beleza e loucura

em cada canto, em cada ponte, em cada esquina.

Caminho nas areias de boa viagem

compro as fantasias no vuco-vuco da cidade,

depois peço a benção no morro de Casa Amarela

me despeço de ti, Recife, tão bela,

vou passar meu carnaval noutra cidade linda, chamada Olinda.

Existe uma alegria

Existe uma alegria

que só se encontra

na harmonia

de uma canção de samba,

da pessoa que ama,

daqueles que são íntimos,

dos amigos queridos,

de uma criança contente,

de quem se sente presente.

É uma alegria

que contagia

e afasta toda a tristeza

da melodia.

é um som transparente,

é barulho, é ruído

de quem está contente

e dança

a dança

na cadência

dos braços

de um amigo, de um amante, de um amado

conhecido ou desconhecido

entre sorrisos

e abraços.

Existe uma alegria

que só numa voz de samba e num canto de amor se anuncia

e se faz presente.

faz sorrir minha alma

traz a paz

eu fico contente

e danço

a dança

na cadência de teus braços

meu amor, meu amado,

te conhecendo ou não,

sou só sorrisos

e abraços.

Vão

Vão ficou meu peito amarga é a sensação. Em vão meus desejos meus pensamentos meus sorrisos meu fingimento. Vão chegaste te acomodaste sorrimos me conquistaste Mas é em vão os amores e as amarguras dos jogos de ilusão.

Ausência

Ele vem, desperta meus sentidos e vai Nem olha para trás Durmo pensando no dito no não dito no indizível Abro os olhos e nada. foi sonho? Apenas indícios da noite passada. Em minha pele ainda está seu cheiro, na boca o gosto do beijo, quando fecho olhos ainda te vejo. Meu corpo inteiro é só desejo. Relembro dos abraços, do calor de teus braços, do movimento, dos eternos passageiros momentos. Mas acordo só, quero tua presença e recebo apenas ausência.

Esperança

À morte estás condenada.

Nascestes para ser defunta,

pois és infundada,

tua conclusões

não tem causas.

Doce palavra que aos sonhos embala

e coloca à deriva num mar de ilusão

passageiros, tripulantes e capitão.

Para tu não há salvação.

Chegas sorrateira, te instalas em meu peito,

faz de mim teu leito perfeito.

Me enches de verdades,

escuto confidente, acredito em tua sinceridade.

Cegas meus olhos,

enebria meus pensamentos,

confunde meus sentimentos,

me envolves no teu véu de Maya.

Te entrego o leme

e me perco

e me deixo vaguear

nessa névoa que é teu mar.

Até que um dia afunde na cegueira

ou desperte pelo sol da clareza...

Adeus Ardilosa!

és mentira, és nada,

à morte foste condenada!

Transeuntes

Contemplo a velocidade dos traseuntes que passam nas calçadas. vidas corridas, semblantes sofridos, rugas de preocupação, ação, ação, ação. O descanso, a espera de fechar o sinal de trânsito. Continuo meu trajeto, até chegar a minha vez, desço da condução e ação, ação, ação.

Do outro lado

-Do outro lado da janela Ela. -Do outro lado da parede Ele. -Escondida pela cortina, sequer me atina. -Atrás de uma pilha de livros, nem sabe que existo. - fecho o livro, dou um gole no vinho, e deixo os pensamentos me levar vou até a janela, quem saber vê-la passar. -Afasto a cortina, abro a janela, deixo a luz entrar. Olho, e do outro lado ele a me olhar. -Apesar da distância, da argamassa, do transito e do cimento, o vento me traz seu perfume, seu olhar, seus pensamentos. -Me cumprimenta, levanta uma taça, diz que veio me ver passar. Sorrio, é hora de se encontrar.

Probabilidade

A lógica dos resultados exatos, o dever de seguir os trâmites corretos, as regras das teorias dominantes, a imposição do que é certo e os incontáveis manuais de intruções... Foi criado numa caixa de boas maneiras, lugar herméticamente calculado. Saiu de lá absolutamente quadrado. Não conseguia se acomodar em qualquer espaço. Rígido, pontudo, machucava todos e tudo. Tornou-se matemático. Mas não dos criativos, e sim daqueles que só vêem problemas e só criam empecilhos. só que um dia, por seus próprios passos, tropeçou e caiu num poço, numa poça, num riacho, num rio, num lago, num buraco...num mar, num ar, num azar... de probabilidade, que aparou suas arestas. Tornou-se esfera, ora flexível, ora fera. De certeza, só tinha a dúvida. Tomo cerveja ou como uva? Redondo, chegava a ser cômico. Como matemático, um fiasco. Mas, como músico, criava melodias de números imaginários e canções de ilógicos resultados, que alegravam a todos e a tudo. E assim, se acomodou no mundo.

Todo pé tem seu chão. Todo chão tem seu botão. Todo botão tem sua flor. Toda flor tem seu amor. Todo amor tem seu pé.


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